29 de jul. de 2010

Radioamadorismo via satélites

Radioamadorismo via satélites
Por Cianus Luis Colossi, PY3DU

“ 2.1 O serviço de radioamador é modalidade de serviço de radiocomunicações, destinado ao treinamento próprio, à intercomunicação e a investigações técnicas, levadas a efeito por amadores devidamente autorizados, interessados na radiotécnica a título pessoal, que não visem qualquer objetivo pecuniário ou comercial ligado à exploração do serviço, inclusive utilizando estações espaciais situadas em satélites da terra.”Artigo 2. Definições, da norma 31/94.


urante as décadas de 70 e 80, operar satélites era privilégio de poucos. Alguns radioamadores mais experientes, se aventuravam em satélites tipo AO7, AO8,RS15,RS12/13, entre outros.
Época de ouro, no qual circulavam em órbita de nosso planeta uma boa quantidade de satélites para radioamador.


No entanto estes satélites operavam basicamente em CW e SSB, com subidas e descidas em dois metros, setenta centímetros e dez metros.

A situação não mudou muito; poucos equipamentos ainda hoje utilizados pelos radioamadores em VHF e UHF, em sua maioria, não operam em SSB e CW ! Ainda assim atualmente, temos alguns equipamentos já bem popularizados, que com certeza permitem este tipo de operação.

Mas na década de 90 o lançamento dos AO27, pela AMRAD (Amateur Radio Research and Development Corporation) em 26 de setembro de 1993 e do SO35 pela Universidade de Stellenbosch, Africa do Sul, em 23 de fevereiro de 1999; vieram pôr fim a elitização deste tipo de operação. Pois estes contavam agora com um transponder, analógico para utilização em FM, permitindo assim que qualquer radioamador possuidor de equipamento para FM em 144 e 430 mhz, pudesse passar a falar via satélite, abrindo caminho para uma excitante forma de praticar o radioamadorismo.

Aqui cabe salientar que existem atualmente vários satélites em FM, mas boa parte deles, é para uso em modos DIGITAIS, PSK, PACKET, ETC. Vamos nos deter naqueles que permitem transferir VOZ.



OS LEO, Low Earth Orbit, Satélite de Órbita Baixa

Todos estes satélites até aqui comentados, são satélites que operam em órbitas na ordem dos 800 km de altura, sendo por tanto facilmente acessados com sistemas de antenas de médio porte.

Estes possuem invariavelmente órbitas do tipo circular, mantendo constante a distancia entre o satélite e o centro da terra. Já os de órbitas elípticas permitem contatos a maiores distancias, mas com equipamentos e antenas bem mais apurados.

No caso dos LEO existe um complicante, que é acompanhar a passagem do satélite que descreve no céu um arco, orientado em azimute e elevação; fazendo com que em cada passagem tenhamos um arco mais aberto ou mais fechado em relação a linha do horizonte.

Vamos supor que um determinado satélite, SO50 por exemplo, nos forneça os seguintes dados relativos a sua passagem:

Inicio da órbita (AOS) = 07:15 aos 359°

Fim da órbita (LOS) = 07:25 aos 180°

Máxima elevação = 57 °

Traduzindo: O satélite, aparecerá as 07:15, AOS (Acquisition Of Signal, ou Aquisição do Sinal) na linha do horizonte em direção ao Norte, descrevendo um arco que passará, quase por sobre o observador entre o Atlântico e o continente, passando pela elevação máxima de 57 ° e iniciando a descida, novamente em direção ao horizonte, saindo pelo Sul, com LOS (Loss Of Signal, Perda do Sinal). Tudo isto dentro de um período de exatos 10 minutos, das 07:15 as 07:25.

Durante este período, todas as estações que estejam dentro do alcance do satélite (foot print), poderão se comunicar, permitindo em média, contatos da ordem de 2000km a 3000 km de distância.

Como toda repetidora,
e satélites são repetidoras voadoras, temos de adotar um canal de entrada e um canal de saída; sendo neste caso as freqüências de subida (Uplink) e descida (Downlink), para o SO50 por exemplo, em 145.850 mhz e 436.796 mhz, respectivamente.

No entanto, em se tratando de uma “repetidora” em movimento os sinais de subida e descida são afetados pelo efeito de doppler, fazendo que durante sua passagem a freqüência varie de 436.805 no inicio (AOS), 436.795 no centro da órbita e 436.790 ao final da passagem (LOS), aproximadamente.

É o mesmo efeito observado por alguém parado em uma calçada, e que por ele passe uma “ambulância de sirene ligada”; fazendo dar a impressão que o som da sirene varie do mais agudo ao mais grave durante o deslocamento.

Nos satélites que operam com transponder em SSB, o efeito se torna ainda mais perceptível principalmente nos sinais em CW. Para completar, além do doppler, temos ainda o spin, rotação do satélite que faz variar a polarização dos sinais, que hora chegam verticalmente , hora chegam horizontalmente polarizados.

AS VARIANTES

Até aqui podemos notar que operar via satélite, requer atenção a uma gama bem ampla de variantes:

  • inicio da órbita

  • coordenada de entrada

  • variação da elevação

  • variação da freqüência

  • variação da polarização

  • variação de azimute

E é exatamente esta quantidade de variantes, que faz da operação via satélite mais uma desafiante opção da prática do radioamadorismo.

A ÓRBITA

Para os mais afetos à matemática, com certeza; calcular manualmente a próxima passagem do satélite é algo gratificante, mas torna sem dúvida a operação bem mais complicada. Para facilitar as nossas vidas entretanto, dispomos atualmente de vários programas muito bons para previsão de órbitas. Entre eles podemos destacar:

  • Winworbit – freeware

  • Orbitron – cardware

  • Nova For Windows – pago

Entre outros tantos que podemos localizar via internet, são os citados, os mais populares entre os operadores de satélites da atualidade. Alguns deste programas inclusive, com a interface apropriada, permitem controlar o conjunto de antenas em azimute e elevação, acompanhando automaticamente a passagem do satélite e dependendo do equipamento utilizado para UP e Downlink, acompanhar a variação doppler.

AS FREQUENCIAS

Uma maneira, bem prática, se obter informações sobre os satélites para amadores, é visitando a página da AMSAT, em www.amsat.org .Alias, antes de qualquer aventura, vale a pena dar uma boa navegada no site da AMSAT!

Cabe aqui um parêntese; referente a utilização dos segmentos do espectro radioelétrico. Para que todos nós possamos continuar convivendo em paz, devemos seguir as normas e os acordos de ética operacional, evitando interferências prejudiciais que acabem inviabilizando não só a operação via satélites; mas todos os outros não menos excitantes e diferente modos de emissão.

A ESTAÇÃO

Após ter adotado o programa escolhido e de posse do conhecimento necessário, para escolher este ou aquele satélite, temos de devotar especial atenção a estação; pois com certeza, dela exclusivamente depende o nosso sucesso.

Antes de qualquer tentativa de transmissão, e este é nosso impulso natural, pois caso contrário seriamos radio escutas, temos de ter certeza absoluta de uma, no mínimo, muito boa recepção! Pois como vimos além de sofrer o efeito de variação de freqüência, doppler, temos o efeito de variação de polarização, spin, além é claro da degradação dos sinais de descida dos satélites, que para uma economia lógica de baterias, (e eles são alimentados por baterias carregadas por meio de coletores solares), as potencias de descida são invariavelmente na casa do 1 watt, fazendo que no caso de satélites de órbitas mais distantes, seja necessário o uso de pré-amplificadores de recepção, que também podem auxiliar neste nosso caso em particular, os LEO.


ANTENAS


Para que isto seja possível, temos de nos ater ao conjunto de antenas de recepção. Para os menos exigentes, podemos utilizar antenas do tipo turnstile, que são compostas por dois dipolos cruzados e defasados a 90º , isto para permitir a recepção em polarização tanto horizontal quanto vertical. Veja figura ao lado.

Este tipo de antena, muito conhecido pelos operadores de satélites meteorológicos, pode ser utilizado com relativo sucesso, em28, 144 e 432 mhz, tanto em recepção como em transmissão.

Uma boa lida nos handbooks da ARRL ou no HANDBOOK DO RADIOAMADOR de Aslaz, elucidará as dúvidas relativas a este tipo de antenas.


Estas porém servem basicamente para órbitas mais próximas, mais por sobre as nossas cabeças, e assim como a operação via repetidoras terrestres, se quisermos alcançar DX, ou seja, órbitas mais baixas que permitam uma maior área de cobertura, aí sim, devemos direcionar nosso poder de fogo, utilizando yagis, principalmente as de polarização circular ou cruzadas.


YAGI DE POLARIZAÇÃO CIRCULAR

Neste tipo de antena, temos duas yagis, na mesma gôndola, defasadas a 90 graus.

Para a yagi, de polarização linear, basta montar somente uma das antenas.

E como já foi dito em parágrafos anteriores, ambos os tipos de antenas, devem ser orientadas em azimute e elevação, manualmente ou por meio de rotores.

Entretanto para o caso dos LEO, devemos tomar cuidado para não se utilizar antenas de alto ganho, pois este faz com que o lóbulo principal

fique muito agudo, tornando a antena muito seletiva, necessitando de correção a todo o momento. Este problema, por outro lado, pode ser reduzido ao se utilizarem sistemas informatizados de rastreamento da órbita, via interface oferecida por alguns programas.

ANTENAS HELICOIDAIS

São estas sem dúvida, a melhor opção para quem deseja realmente uma operação séria e eficiente, via satélite. Devido ao seu formato em espiral, permitem com bom ganho uma recepção circular perfeita, podendo ser polarizadas tanto a direita (RHCP= Right Hand Circular Polarization) quanto a esquerda (LHCP= Left Hand Circular Polarization), sendo padrão para operação via satélites, a polarização a direita.


O EQUIPAMENTO

Com o advento dos satélites em FM, ficou muito fácil operar estas repetidoras espaciais, pois a grande maioria dos equipamentos oferecido ao mercado, possuem condições tanto de transmissão quanto de recepção.Neste caso em particular o ideal e preferível, é que se tenha condições de efetuar a monitoração de descida do sinal do satélite, durante nossa própria transmissão.

Muitos preferem em função de seletividade, versus sensibilidade, a utilização de equipamentos independentes para UP e Downlink, permitindo assim além da boa operação via satélite, também a operação de DX em VHF e UHF, entre uma passagem e outra.
Atualmente porém, a grande tendência é a fabricação de equipamentos multibanda, oferecendo numa única peça a possibilidade de operação automática em bandas cruzadas e correção automática de doopler, em alguns modelos específicos.

Para os equipamentos mais comuns, e voltando aos satélites em FM, devemos ter em mente as seguintes características:

  • DUAL BAND

  • FULL DUPLEX

  • Comandos independentes para cada banda

  • STEP mínimo de 5 khz, pois para alguns rádios o passo menor é de 10 khz, impossibilitando a operação de recepção, devido do doppler.

  • Transmissão com subton, programável.

Uma boa opção para quem deseja operar de maneira econômica; é a utilização de seu VHF base para o Uplink acompanhado de um HT para recepção, fazendo com que assim se possa inclusive, operar de maneira portátil, abrindo um novo leque de opções para a operação via satélite.

Pode-se também, optar pela operação QRP, utilizando para isto rádios HTs, tanto no RX quanto no TX, desde que utilizadas as antenas apropriadas.



A OPERAÇÃO PORTÁTIL

O autor deste pequeno texto, por experiência própria, operou portátil/móvel em várias cidades do Rio Grande do Sul via UO14.

Para isto, experimentei os seguintes arranjos:

1) Uplink: FT23R, HT, 5 watts e yagi de 3 elementos, montada em cano de pvc.
Downlink: ICU68, HT, com yagi de 3 elementos, montada na mesma gondola de VHF, defasadas em 90 graus.

2) UP/Downlink: TM721A, dual band, sem duplexador, com yagi dual band, parecida com a da figura ao lado, porém com gôndola em PVC e elementos em FIO de cobre, 8 mm.

3) Uplink: TM 7212 A, antena vertical ¼ de onda, base magnética.
Downlink: ICT7A, ht dual band, antena yagi de 5 elementos, polarização linear.


Em todos os casos acima, as antenas são utilizadas na mão do operador, permitindo apontar as mesmas para o satélite durante a passagem, com a vantagem de poder variar a polarização, de vertical para horizontal rápida e facilmente. Em todos os casos, foram observados 100 por cento de sucesso nos QSOs via satélite. Sendo porém por comodidade, em função do peso das antenas, adotado o ultimo arranjo. Tendo em vista a antena de Uplink ficar fixa no veículo, fazendo com que a yagi de Downlink fosse utilizada só com os elementos de UHF, pesando perto de 0,3 kg.


MÃOS A OBRA

Assim sendo e de posse destas informações, aliadas a perspicácia e ao desejo da aventura, características típicas do RADIOAMADOR VERDADEIRO, temos as ferramentas mínimas necessárias para dar início a operação via satélites, adicionando ao nosso currículo de radioamador mais um excitante modo de exercício, deste tão maravilhoso mundo das radiocomunicações.

Um comentário:

Radiocomunicação disse...

Ótimo texto, vou recomendar para um pessoal que é interessado no assunto.